“Memórias do Trabalho” preservam identidade colectiva de Alcochete
Integrado no Plano de Memórias do concelho de Alcochete foram apresentados no passado sábado, 25 de Setembro, os primeiros resultados do projecto “Memórias do Trabalho”, numa iniciativa que juntou no Núcleo de Arte Sacra alcochetanos que contribuíram com o seu testemunho para o enriquecimento do projecto, população em geral, além do presidente da Câmara, Luís Miguel Franco e o vereador Jorge Giro.
Com o desenvolvimento do Plano de Memórias do concelho de Alcochete é objectivo da Câmara Municipal preservar a memória colectiva: “Um dos objectivos políticos do desenvolvimento deste Plano de Memórias está relacionado com a preservação das nossas memórias e a consequente valorização da nossa identidade local”, referiu o Presidente da Câmara.
“Até num contexto histórico em que o Município de Alcochete se confronta com um dos maiores desafios da sua história, além de estarmos integrados na Grande Área Metropolitana de Lisboa, estamos dotados de extraordinárias acessibilidades que permitiram um incremento no desenvolvimento demográfico em Alcochete, mas também no contexto temporal, em que se anuncia a construção do Novo Aeroporto de Lisboa é fortemente expectável que no futuro este desenvolvimento demográfico continue a verificar-se e que seja inclusivamente incrementado”, referiu Luís Miguel Franco.
Ainda na fase de diagnóstico, o projecto “Memórias do Trabalho” teve como pontos de partida, o crescimento e declínio da salicultura, actividade muito importante nos anos 50, 60 e 70 do século XX para as gentes de Alcochete, e a instalação da Firestone que teve consequências sociais, económicas e culturais.
A apresentação dos primeiros resultados do projecto esteve a cargo do Dr. Marto Alves e da Dra. Cíntia Mendes, técnicos da Câmara Municipal que nas suas intervenções fizeram a caracterização das temáticas em análise, as práticas, os objectos, os espaços, as representações linguísticas que fazem parte do Património Cultural Imaterial.
Na génese deste projecto está a Memória do Trabalho, investigada com base na recolha de depoimentos e de documentos pessoais, tais como fotografias, além da pesquisa documental, com o objectivo último de alcançar uma caracterização social, cultural, económica e política.
Da pesquisa já efectuada é possível caracterizar a salicultura como uma actividade que carregou e carrega uma grande carga sentimental entre os alcochetanos que trabalharam nas marinhas. A saudade, o amor, a dor e a lembrança são sentimentos indissociáveis do trabalho das marinhas.
Este trabalho de investigação permite também auferir as condições sociais, económicas, habitacionais e educacionais das pessoas que dedicaram a sua vida ao sal, assim como das suas famílias. Eram numerosas as famílias de então em Alcochete, com pouco escolaridade, face à necessidade de começar cedo a ganhar algum dinheiro, viviam em casas pequenas e com poucas condições e trabalhavam sem vínculo laboral, com poucas ou nenhumas condições de trabalho.
Com a instalação da Firestone em 1960, primeira fábrica a ser instalada no Concelho, as gentes locais passaram a ter uma alternativa ao trabalho sazonal nas salinas, e ter acesso a um trabalho anual, do trabalho sem vínculo laboral passaram a ter uma situação profissional definida, que integrava alguns privilégios, tais como saúde e higiene e segurança no trabalho.
O trabalhador da Firestone marcou a diferença em Alcochete nos anos 70 e 80, em vários segmentos da população, nomeadamente no caso de rapazes com escolaridade reduzida, que lhes permitiu deixar o trabalho sazonal, nas marinhas, carvão, nos barcos, entre outras, para serem operários e ter um salário assegurado o ano inteiro.
A instalação da Firestone em Alcochete significou também uma nova oportunidade de emprego na região numa época em que o emprego das mulheres praticamente não existia.
Enquanto conclusões prévias já é possível auferir que se verificaram melhorias significativas com a entrada em funcionamento desta fábrica, particularmente no que concerne ao modo de vida da população, aumento da frequência escolar, modificações de hábitos sociais, distinção entre trabalho sazonal e anual, modificações nas vivências sociais, alteração do papel da mulher e o seu contributo na economia do lar.
Numa fase futura o trabalho de investigação vai avançar no terreno para estudar as outras indústrias implementadas no Concelho, além da recolha de depoimentos de antigos funcionários.
Esta apresentação traduziu-se num primeiro diagnóstico em direcção a uma caracterização ampla da comunidade, que pretende preservar a memória do conjunto de instituições que muito contribuíram para o crescimento e desenvolvimento do Concelho e possibilitou a criação de postos de trabalho, numa região que até então vivia dependente do sal, da terra e do rio Tejo.
As conclusões deste estudo vão estar sistematizadas numa monografia publicada pela Autarquia, e a par com toda a documentação complementar, ficarão disponíveis no centro de documentação do Museu Municipal.